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O surgimento de Perto do coracao selvagem, em 1943, causou grande impacto no cenario literario brasileiro, proporcionando a autora aclamacao imediata da critica e de seus colegas escritores.Houve quem encontrasse no livro a influencia de Virginia Woolf, ao passo que outros apostavam em Joyce, seguindo a falsa pista da epigrafe da qual Clarice pincou seu titulo: Ele estava so. Estava abandonado, feliz, perto do coracao selvagem da vida. Ambos os grupos estavam errados, apesar do uso do fluxo de consciencia pela escritora estreante a justificar tais correlacoes. Ocorre, no entanto, que esse havia sido um achado natural e espontaneo para Clarice Lispector, que admitiu como unica influencia neste caso O lobo da estepe, de Hermann Hesse. Nao em termos estilisticos tampouco por se identificar com o carater do protagonista, mas sim por compartilhar com ele e, sobretudo, com Hesse, o desejo imperioso de romper todas as barreiras e ultrapassar todos os limites na busca da propria verdade interior. Anseio personificado pela personagem central, Joana, com uma expressao que se tornou celebre: Liberdade e pouco. O que desejo ainda nao tem nome. Intima e universal, destemida e secreta, Joana sentia o mundo palpitar docemente em seu peito, doia-lhe o corpo como se nele suportasse a feminilidade de todas as mulheres e ela destoava do sistema patriarcal em que se encontrava inserida da mesma forma que Clarice se distanciava da literatura de seu tempo, ainda dominada pelo regionalismo e o realismo. Ambas, autora e protagonista, eram forcas divergentes, porem nao dissonantes, ja que introduziam uma nova musicalidade, uma harmonia propria, poetica e triunfal, na aspereza circundante, enquanto buscavam o centro luminoso das coisas sem hesitar em mergulhar em aguas desconhecidas , deixando o silencio e partindo para a luta. Deste embate a beira do intimo abismo, Joana torna-se uma mulher completa e Clarice, uma escritora singular e inimitavel.