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O clássico fundador do romance moderno em nova tradução de Ernani Ssó, com introdução do acadêmico britânico John Rutherford e posfácios de Ricardo Piglia e Jorge Luis Borges.
Dom Quixote de La Mancha não tem outros inimigos além dos que povoam sua mente enlouquecida. Seu cavalo não é um alazão imponente, seu escudeiro é um simples camponês da vizinhança e ele próprio foi ordenado cavaleiro por um estalajadeiro. Para completar, o narrador da história afirma se tratar de um relato de segunda mão, escrito pelo historiador árabe Cide Hamete Benengeli, e que seu trabalho se resume a compilar informações. Não é preciso avançar muito na leitura para perceber que Dom Quixote é bem diferente das novelas de cavalaria tradicionais – um gênero muito cultuado na Espanha do início do século XVII, apesar de tratar de uma instituição que já não existia havia muito tempo. A história do fidalgo que perde o juízo e parte pelo país para lutar em nome da justiça contém elementos que iriam dar início à tradição do romance moderno – como o humor, as digressões e reflexões de toda ordem, a oralidade nas falas, a metalinguagem – e marcariam o fim da Idade Média na literatura.
Mas não foram apenas as inovações formais que garantiram a presença de Dom Quixote entre os grandes clássicos da literatura ocidental. Para milhões de pessoas que tiveram contato com a obra em suas mais diversas formas – adaptações para o público infantil e juvenil, histórias em quadrinhos, desenhos animados, peças de teatro, filmes e musicais -, o Cavaleiro da Triste Figura representa a capacidade de transformação do ser humano em busca de seus ideais, por mais obstinada, infrutífera e patética que essa luta possa parecer.