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Acontecimento Da Poesia

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   Nem sempre a poesia se encontra onde se vê anunciada. Boa parte das vezes, aliás, ela prefere calar-se ??? mistura-se às coisas do mundo e espera o insight, para só depois deixar-se imprimir sobre a fina película das palavras. Entre o vento e o verso, algo acontece e ainda não sabe dizer o nome. Todo poema flagra um instante.

   E o leitor, como participa disso? Ao ler as páginas de Fernando Pessoa, por exemplo, que rosto coloca sobre o rio das imagens? Ou, para evocar outro tema deste livro, por que o primeiro-ministro de Israel decide proibir o ensino de um escritor palestino nas escolas de seu país? E no filme de sucesso: por que o diretor explora a amizade do poeta sentimental com o carteiro? São questões desse tipo que nos fazem pensar sobre o lugar da poesia e de suas imitações baratas. 

   Questões que também inquietaram Fernando Paixão e o instigaram a escrever alguns dos ensaios presentes. Acontecimento da poesia traz uma série de textos concebidos nas três últimas décadas, sob diferentes demandas; e inclui, ainda na primeira parte, um depoimento sobre José Paulo Paes, um testemunho sobre livro de Alfredo Bosi, além de fecunda reflexão sobre as relações poéticas entre Brasil e Portugal.

   Na segunda parte, os ensaios versam sobre diferentes poetas e obras, sempre com o propósito de flagrar a particularidade de cada experiência ??? que é singular, sem dúvida, sobretudo quando se trata de escritores como Vinicius de Moraes, Rubens Rodrigues Torres Filho, Georges Bataille, Mário de Sá-Carneiro, entre outros, contemplados com uma reflexão aguda. Na parte seguinte, é o próprio autor quem apresenta seu universo lírico, por meio de um depoimento e uma entrevista.

   No conjunto, percebe-se como o olhar de Fernando Paixão se mostra sensível, sem perder o rigor, e muitas vezes envereda pelo caminho poético ao conduzir o pensamento crítico. Em suas mãos, a reflexão toma a poesia por aliada; e, juntas, levam o raciocínio mais longe. O importante, diz ele, é reconhecer na arte poética ???uma intervenção simbólica vigorosa ??? de alto poder encantatório (ou corrosivo) sobre as coisas???.

   Quando isso ocorre, estamos diante da verdadeira escrita: acontece a poesia.

Fernando Paixão nasceu em Portugal e vive em São Paulo desde a infância. De início, teve uma longa carreira como editor profissional; nessa área, organizou Momentos do livro no Brasil (1995, Prêmio Jabuti). Em 2009, ingressou na docência acadêmica e, desde então, leciona literatura no Instituto de Estudos Brasileiros, da Universidade de São Paulo. No ensaismo, publicou Narciso em sacrifício (Ateliê, 2003), sobre a obra poética de Mário de Sá-Carneiro, e Arte da pequena reflexão (Iluminuras, 2014), sobre o gênero do poema em prosa. Dedica-se também à poesia, com 6 livros publicados, ganhador do Prêmio APCA em 2002 com o livro Poeira. Seu livro mais recente é Porcelana invisível (2015), pela Cosac Naif.